segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

I'm singing in the rain...



Já tentaste agarrar a chuva? Quando chovem pedras preciosas de água e a cidade se inunda?
Diz-me, já tentaste agarrar a chuva?
Já ficaste com a mão molhada e a manga do casaco molhada e o braço molhado de tentar agarrar a chuva?
E o frio da chuva que te refresca a alma enquanto a chuva te encharca de esperança…
Já te perdeste em mares de histórias que viveste e viverás em noites de chuva, iguais a esta, da mesma força e de igual intensidade?
Já tentaste agarrar a chuva, quando chovem rios de chuva nas ruas da noite vazia e calma? Alagando e diluindo tudo cujo conteúdo é vão e supérfluo.
Quando a cidade se fecha em casa e fecha as janelas à chuva, à sumptuosa e poderosa chuva, criando barreiras e fugindo à chuva, com medo do seu encanto, do seu vicio, com medo de gostar de chuva?
Mas tu não, tu choves com a chuva que chove e flúis. Livremente.
E ris-te com a chuva que toca sinfonias em allegro e cascatas, que canta com tribos de bongos sortidos e sonoros, quando cai no chão e bate nos parapeitos das janelas fechadas e nos candeeiros quentes fazendo faíscas de fumo, criando múltiplas reacções e ecoando alto mas sempre delicadamente, tranquilamente, naturalmente.
Já tentaste agarrar a chuva enquanto os pássaros amedrontados cantam escondidos nas árvores dos imperiais, turbulentos e até teatrais, trovões?
Já tentaste agarrar a chuva e ser louco? Ser somente como a chuva que chove? Simples!
Enquanto o cheiro de terra molhada te afunda de um supremo, quase veneno, prazer?
Já tentaste agarrar a chuva? Quando a chuva relampeja contra o cepticismo deste mundo que não gosta de chuva, nem de se molhar… Purificando o teu olhar para que vejas nesta chuva muito mais do que um deprimido e contido céu cinzento?
Já tentaste agarrar a chuva sem decifrar se o teu rosto húmido é apenas fruto de chuva ou da felicidade que te invade? Em gotas densas, insaciáveis, incontroláveis.
Já escutaste e abraçaste a chuva?

Já dançaste e beijaste a chuva no pescoço?
Já fizeste amor com a chuva, tornando-te chuva que com a chuva chove?
Diz-me, já tentaste agarrar a chuva?
Eu já. E gostei…

(metáforas de chuva)

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Sabor a pouco

Sabe-me a pouco a boca e o peito amargo.
Num sufoco zumbido, que não mata mas mói,(mói e dói).
Sabe-me a pouco ser assim impotente, não ser indiferente.
Sabe-me a pouco o esboço que fiz de nós, não saber sem tinta.
(Os esboços que nunca deixaram de o ser, e ficaram por pintar.)
Sabe-me a pouco a boca e o peito amargo, amargo não, frio.
Sabe-me a pouco o teu sorriso na mente sem o teu cheiro no corpo.
Sabem-me a pouco as palavras que escrevo, (e não grito),
Automaticamente ensaiadas, fingidas. Letras combinadas, esquecidas,
Perdidas, como eu.
Que faço de mim, bonita, incompleta, sem câmara, sem fita, sem Poeta?
Que faço ao que tenho cá dentro? Relativizo-o a vento?
Não quero saber a assim.
Sou bicho do mato à procura de toca, borboleta sem casulo,
Ninho que nunca o foi.
E não quero saber mais assim.
Mas tu foges com o medo, meu amor, e levas o teu encanto contigo.
Não ficas antes comigo, no meu abraço que já é teu.
Foges com o medo, no vento.
E eu também fujo, ou tento.
Mas eu não quero saber assim.
Ainda assim, sou mulher se te deixo e menina se acredito?
Podias dançar-me até ao fim, enquanto o piano toca.
Gosto demais de tango para dançá-lo sozinha,
E tu és um bom par. (Imagino)
Irreflectida, irracional, impulsiva.
Intensificada, exagerada, apaixonada?
Paixão é simples, descomplicada.
No mínimo, verdadeira, é o que sei saber.
Não te minto que te quero, (sabes-me a pouco), tu sabes, mas inteiro.
Volto a ser pássaro sem direcção,
Volto a ser sem ser de todo,
Mas tenho o mundo e o por-do-sol comigo.
Sabe-me tanto este sabor a pouco.
Sabe-me a pouco o sabor a tanto.